Fiquei chocada ao abrir meus e-mails e me deparar com este lamentável acontecimento.
Vejam até onde pode chegar a intolerância absurda dos homofóbicos.
Relato de Carla Machado:
"Amigosestou dividindo com vocês uma situação por que passei hoje em São Paulo no Posto de Bilhete Único Especial - estação Marechal Deodoro do metrô.Levei algumas horas pra conseguir me reequilibrar e escrever este relato, na forma de resumo do que aconteceu durante mais ou menos uma hora dentro desse recinto público, e espero que sirva como um caso que expresse a vivência de tantas outras pessoas que devem passar por estes problemas e sentimentos todos os dias. Espero que consigamos mudar esta e outras formas de se lidar com um cidadão, especialmente nos ambientes de serviço público... ----------------------- Hoje, 8 de fevereiro de 2010, após uma longa jornada em médicos, peritos, assistentes sociais e outros corredores do SUS, fui, de posse dos documentos necessários, fazer o cadastro para obtenção do meu bilhete único especial, no posto da estação Mrechal Deodoro. Na semana passada eu já havia ido ao posto do Shopping Light tomar as devidas informações com relação a questão do uso nome social nos laudos médicos necessários, para evitar problemas, pois o meu cartão do SUS está registrado com meu nome social em simpáticas e vitoriosas letras. A atendente daquele posto me disse que não haveria problemas, e que eles encaminhariam o processo com o nome conforme o que constasse nos laudos médicos. Chegando lá hoje então, uma simpática atendente com o nome de Ana analisou a documentação, e percebeu que nos laudos constavam meu nome social e nome de registro. Após todos os esclarecimentos de praxe, ela me disse "Sem problemas, eu só preciso verificar com meu supervisor como iremos fazer isso, pois o espaço para impressão do nome no bilhete é pequeno". Ela chamou o supervisor, que escutou a questão que ela colocava. Nossa, foi impressionante a mudança nos seus olhos, conforme ela falava. Ele se virou pra mim e disse: "Cadê o RG?". Quando lhe ofereci começaram os insultos. Disse "NÃO TEM NADA DISSO. TEM QUE TRAZER UM LAUDO COM SEU NOME" Eu então tentei explicar que o meu nome é Carla, que eu passei por uma cirurgia de adequação genital, por ser transexual, e que tenho um processo judicial ainda em tramitação para mudança, etc. e ele foi logo me cortando, bem alto e em bom tom: "SEGUINTE MEU SENHOR, AQUI NÃO TEM NADA DISSO. SEU NOME É ALEXANDRE. SEU PROBLEMA PESSOAL VOCÊ PODE BRIGAR COM QUEM QUISER, COM A JUSTIÇA, MAS AQUI É DO JEITO QUE EU QUISER". Olhei pros lados e a essas alturas todos tinham parado de fazer tudo, os atendentes, os usuários, estavam todos olhando pra minha cara. Eu pedi a ele que pelo menos me tratasse em público com meu nome social, além do mais estava uma ila de pessoas que aguardavam atendimento, todas me olhando. Ele respondeu "Eu vou tratar com este nome que está aqui no RG". Eu insisti, com toda a educação e voz baixinha que eu tenho, como vocês me conhecem, que por favor respeitasse a minha identidade de gênero. Inclusive o meu cartão do SUS apresentado a ele já traz a menção ao sexo FEMININO, conforme pedido pelos médicos da UBS onde sou atendida, que constatam minha história. Ele respondeu perante todos: "QUE IDENTIDADE NADA. VOCÊ É UM HOMEM, RAPAZ" Eu insisti em perguntar se ele não poderia me respeitar como cidadã. Ele nem me deixou terminar e respondeu com todas as letras "NÃO, NÃO VOU RESPEITAR. AQUI O TRABALHO É PRESTAR ATENDIMENTO" Eu falei que existia um decreto municipal do uso do nome social na prefeitura muito recente, que talvez ainda não tivesse chegado ao seu conhecimento, etc.. ele me cortou: "QUE HISTÓRIA DE DECRETO, NINGUÉM É LOUCO DE ASSINAR UM NEGÓCIO DESSES" Eu insisti para que ele procurasse saber. Ele foi até o telefone levando meus documentos. Passou um minuto e voltou dizendo alto me devolvendo o RG: "ALEXANDRE, não existe isso". E voltou para o fundo da sala. Vendo todo aquele constrangimento, que já se extendia por mais de 10 minutos, a atendente me sugeriu "Vamos fazer no seu nome de registro mesmo, pra você evitar mais problemas, etc.." Eu disse que sim, que assim seria. E então ela começou a registrar o cadastro com o no nome de registro, e a surpresa maior foi que ele gritou lá do fundo da sala "O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO? EU NÃO VOU ACEITAR ESSE LAUDO". Eu ainda insisti, com educação, perguntando se ele não poderia levar a justificativa à SP Trans com cópia do meu cartão do SUS, pra justificar que o médico havia colocado os dois nomes.. ele respondeu: "NÃO VOU FAZER NADA, ESSE LAUDO É DE UMA PESSOA QUE NÃO EXISTE". Eu disse a ele que eu existia sim, que estava ali, uma cidadã, correta, limpa, de 37 anos... Ele apenas respondeu que não existia, e que se eu insistisse, ele disse "EU AINDA MANDO TE LEVAR POR FALSIDADE IDEOLÓGICA" Nessa hora as próprias funcionárias pareciam não acreditar Eu fui até um senhor que estava saindo perguntar se ele poderia ser minha testemunha e todos ficaram observando, ele pareceu constrangido pelo olhar do sr. Lima e apenas me negou dizendo .. "eu tenho medo que e fizer isso, do jeito que eu vi aqui, nem os meus documentos eles fazerem". Eu voltei até a funcionária e ainda perguntei a ela.. "Você pode confirmar o que você está vendo aqui, se eu chamar um diretor?", ela respondeu "Infelizmente eu não posso, pois irei perder meu emprego". Eu peguei o telefone e comecei a ligar para o CADS, depois Centro de Referência, etc, mas naquele horário as pessoas estavam em reuniões. Gastei todos meus créditos em mais de 20 minutos de conversa, enquanto eles fechavam as portas. A assistente social do CR me retornou dizendo que estava tentando entrar em contato com o advogado do Centro. Nesse momento as portas estavam fechadas, e estava eu lá, com uns 5 ou 6 seguranças fechada dentro daquela sala..Eu via o sr Lima a uns 10 metros de distância rindo com eles contando a cada um que chegava sobre mim, e eu escutei ele pronunciando a palavra "TRAVECO" por diversas vezes. E os seguranças se curvavam de rir. A cena, eu gostaria muito que este relato chegasse à SPTrans e que eles pedissem a gravação das câmeras de segurança pra comprovar as imagens. Vão poder ver e imaginar como eu estava me sentindo - um animalzinho acorrentado no meio de um circo. Nessa hora eu, ainda sentada no banquinho da espera, liguei para um amigo da Secretaria de Justiça, ele me orientou o que eu deveria fazer, e disse que se eu ficasse ali eu estava arriscada a ser agradida. Mas que o correto seria eu procurar mesmo a ajuda policial se isso ocorresse. Eu perguntei então ao segurança se eu poderia ficar ali esperando alguém pra me ajudar a resolver, ele foi ter com o sr. Lima, que nesse momento parou de rir, e voltou dizendo: "Ele disse que se você ficar aqui VAI EMBOLAR O MEIO DE CAMPO". Saiu o sr Lima e logo voltou, com mais dois seguranças, desta vez armados. Uma era mulher. Eu achei que fossem policiais e pensei.. "Bom, que bom, agora ele vai pelo menos parar com os insultos". Mas acho que eram seguranças do próprio metrô. E ficaram de longe. Em nenhum momento me exaltei. Mesmo tentei manter a serenidade pra tentar fazer com que ele me escutasse e mudasse a imagem que parecia ter de uma pessoa como eu. Nessa hora um medo tomou conta de mim. Eu já comecei a imaginar o que eu poderia sofrer lá dentro com aqueles seguranças armados e resolvi sair. Quando passei no meio deles, pareciam que queriam me chutar. Um deles abriu a porta, e ainda deu pra escutar da calçada e perceber com rabo de olho, o riso de escárnio desse senhor José Lima. Bem transtornada, nem sei como consegui caminhar de volta ao posto de saúde da Barra Funda, onde fui até a assistente social para "corrigir" meu nome no laudo, conforme ditado pelo responsável pelo posto José Lima, mas a funcionária me encorajou a fazer valer meu direito. E ainda acrescentou.. "existe um decreto. Assinado pelo sr. Kassab. Acho que o Kassab não iria gostar nadinha de saber que estão fazendo isso com o que ele determinou". Daí eu decidi..Amanhã eu irei novamente ao posto Barra Funda. E tentarei novamente fazer o meu cadastro para emissão do meu novo bilhete. Mas desta vez vou com testemunha. Nestes meus 37 anos, e 5 aprendendo com a militância dos direitos humanos LGBT, esta é a primeira vez que trago a público uma denúncia de discriminação e preconceito ocorrido comigo. As frases que foram proferidas pelo senhor José Lima eu coloquei a íntegra, exatamente como saíram da boca dele, sem nenhum acnto a mais, nenhum a menos. Até porque lembro de cada palavra, até porque cada palavra ficará guardada, infelizmente, e como tantas outras violências que sofremos todos os dias, não conseguimos apagar tão fácil. Isto aí acima acontece todos os dias, em diferentes graus de intensidade de preconceito, mas agora com esse decreto, me sinto no direito de publicamente cobrar o direito que me disseram que eu tenho. E que nunca havia cobrado. Como todas as outras travestis e mulheres e homens transexuais, vivemos sendo constrangidas em muitos dos momentos dos nossos dias, por conta de ter atributos diferentes do sexo que aparentamos. Ou porque nos atribuíram nome, sexo, e comportamento que são diferentes do que nós temos na realidade, e da forma como realmente vivemos. E agora está na hora de faermos jus às poucas vitórias que conquistamos. Carla Machado"
15 comentários:
May,
postei este texto no Transcool, para que haja a maior visibilidade possível sobre este acontecimento terrível!
Beijos.
Lamentável! Que espécie de ser humano é esse Lima? Um lixo! Espero que ela consiga o cartão com o nome social e que esse m... possa pagar por tamanha falta de respeito e educação. Ah! se fosse comigo...
Meu deus até aonde vai a mediocridade dessa gente?! Noossa, estou chocado, não consigo para de chorar aqui, de raiva, de indignação por conta disso, é muita humilhação pra qualquer tipo de ser humano.
Espero que esse cidadão seja devidamente punido exemplarmente!
http://ecleticando.blogspot.com/
Sei que assim como vc, Fênix, todos que receberam este e-mail pela manhã de ontém, ficaram chocados e indignados com tamanha crueldade!
É,Jade... quando a gente pensa que as coisas estão tomando um rumo positivo, infelizmente nos deparamos com gente dessa espécie que estaciona no tempo.
Muito obrigada por divulgar este caso triste, porém muito importante, no seu blog que tem uma visibilidade muito grande, Coelho. Quanto mais pessoas tomarem conhecimento dessas atitutes desumanas melhor. Muitíssimo obrigada!!!
Nossa que situação constrangedora, se ela quiser pode entrar na justiça por danos morais, preconceito, humilhação, ameaça, difamação e diversos outros crimes onde pode ser enquadrado.
Espero que ela consiga vencer na justiça contra essa ato covarde e animal deste sujeito chamado Lima. E também que consiga fazer o cartão com nome social.
O pior de tudo é que outras pessoas tem medo de se por como testemunhas só por se tratar de uma trans.
Até quando isso irá ocorrer?
Vou até fazer um post sobre isto.
Beijos May.
É, não tem quem não fique revoltado com este fato ocorrido, Wesley. Bjs pra vc também!!!
Eu acho o seguinte, vcs próprias travesti se queimam, vcs adoram falar que são discriminadas, mas eu já fui roubado por um traveco filho da puta e aí ? Por favor, não se fazem de santas pq vcs não são, são sempre aidéticas e depressivas, não querem estudar e nem trabalhar de forma digna, só querem dinheiro fácil, assim é mole..enfrentem o preconceito com trabalho e estudo, não fiquem por aí roubando, querendo luxo a todo custo não, deem exemplo, pq aí sim, a discriminação irá mudar, mas são preguiçosas demais, fazer o que....
A princípio eu desconsideraria este comentário, até porque, meu humilde blog foi criado com temáticas com menos seriedade. Mas quando me deparei com este fato, me senti na obrigação de compartilhar, assim como meus amigos blogueiros fizeram em resposta a nossa indignação. Quanto a vc ter sido lesado por uma travesti, cujo entendo perfeitamente sua revolta, e lamento que muitas delas não poupem esforços para prejudicar a nossa imágem, sendo que a até a própria mídia muitas vezes se encarregue de fazer isso sem o mínimo pudor para conseguir audiência em cima de polêmicas. Quanto ao fato de serem todas aidéticas e depressívas, uma pessoa com o mínimo de conhecimento do assunto, sabe que não é verdade; vou me limitar a escrever só isso porque não acho que seja necessário, acho que nem adiantaria discutir isso com alguém de com uma visão tão limitada do assunto. Depressívas?! Felizmente, nunca me vi com inclinação para recorrer a o uso de drogas, seja do tipo que for, pois sequer bebo. Até porque, Graças à Deus, tive uma ótima estrutura familiar, pois não vim de uma família preconceituosa e apegada ao falso moralismo. Cresci ouvindo meus pais pregando: "Nunca faça para os outros o que não quer que seja feito pra você!", e me orgulho muito e sei o quanto isso me foi útil, pois acredito muito na lei do retorno. Embora eu seja travesti, sempre procurei passar a melhor imágem possível e só Deus sabe o quanto é difícil fazer isso, já que muitas das minhas colégas "tristes e depressívas, já dominadas pelas drogas", se incubem justamente de mostrar o lado oposto da nossa realidade.
Continuando...
Quanto a estudar, muitas abandonam o estudo por pura pressão do preconceito social e familiar; isso é outra coisa da qual também não vou me aprofundar, pois eu passaria muitas horas aqui digitando e nem sei se valeria a pena. Trabaho: Vc sabe quantas pessoas assim como vc no mundo tem essa mesma visão? Certamente não. Até fico na dúvida se depois deste teu comentário vc é mesmo preconceituoso ou usa tudo isso com o intuito de alguma auto-defesa. Vc não faz idéia da vida precária que teríamos que enfrentar se fossemos nos submeter aos empregos convencionais. Não preciso citar o tipo de cargos que estariam dispostos a nos oferecer. Teríamos que trabalhar de dia para poder comer a noite. Preguiçosas...??? É porque vc não faz idéia do que é ter que enfrentar a protituição! Além do esforço físico, o psicológico é muito mais abalado. Bom, Roger, de qualquer forma, peço desculpas se em algum momento me fiz parecer ofensiva, embora vc em nenhum momento tenha se preocupado com isso, mas, sinceramente espero que algum dia vc tenha a oportunidade de conhecer alguma travesti com outros propósitos além de querer te roubar ou algo parecido. Generalizar assim, pode acreditar... é um erro que vc está cometendo. Mas, ainda assim respeito a sua opinião, até porque, nem todos vão ter a mesma visão sobre qualquer questão que seja. Seja bem-vindo sempre!
Quanto ao comentário infeliz do Roger, acho que passou um tom preconceituoso em dois momentos, um quando chama travestis de "traveco" e a outra quando generaliza dizendo que são "aideticas e depressivas".
Não concordo com nenhuma palavra deste sujeito que parece não entender muito sobre as travestis e trans, então vou comentar aqui para ver se esclarecem as idéias.
É muito fácil generalizar toda uma classe por causa de meia dúzia que roubam, matam e te sacaneiam, é muito fácil julgar, apontar o dedo na cara e tudo mais. Dificil é abrir a mente e pensar que nem todas as travestis e trans são assim como mencionado pelo Roger.
Conheço diversas travestis e trans que são mulheres maravilhosas, que se dão o respeito, que apesar de sofrer preconceito não são depressivas e muito menos aidéticas. Conheço diversas travestis que trabalham em outras áreas que não é a prostituição.
Para se ter uma idéia, existem travestis médicas, enfermeiras e tudo mais, mas isto é uma pequena parcela daquelas que tiveram sorte de conseguir completar seus estudos para se formar e mais sorte ainda por serem aceitas nas empresas, pois conheço bastante travesti com curriculo bom e não conseguem emprego pelo simples fato de serem travestis.
Então como a travesti precisa sobreviver tem que ir para as ruas por necessidade, e muita gente acha que elas vão por pura vontade própria, ledo engano.
Esse rapaz precisa conhecer mais a fundo sobre a vida das travestis e trans, pelo visto só conhece de chegar na calada da noite e procurar as travestis com um fim único e exclusivo só para sexo. É lamentável isso, pois criticar é muito fácil, agora dar solução e assumir as próprias atitudes poucos são homens o suficiente para fazer isto.
Beijos May.
Obrigada mais uma vez pelo seu comentário ao nosso favor, Wesley. Vc mais do que ninguém, entende das flores e espinhos que cruzam nossos caminhos. Te adoro muitíssimo!!!
May, obrigada pelo gesto de solidariedade. Informo que há desenrolar sobre este caso, em matéria de ACAPA - irei postar o link em seguida.
Gostaria de registrar também minha decepção com relação ao comentário feito pelo proprietário do Transcool, acho que sr. Coelho, quando copiou este post para seu blog.
Como imagino que ele não publicará meu registro, fica aqui minha insignação com relação ao desrespeito que um apreciador de travestis e formador de opinião por ter um blog afim, possa ter pelas pessoas que não vão de encontro aos seus interesses pessoais (no caso uma mulher que passou pela cirrgia).
Até chamar de castrada e travesti operada ele chamou.
Isso é a maior inverdade, dado que sou plenamente realizada e feliz, e considero este um desrespeito maior do que o do próprio supervisor do metrô.
De qualquer forma, agradeço ua solidariedade.
Carla Machado
Fico muito feliz em saber que, pelo menos alguns passos positivos foram dados ao nosso favor, embora muitas coisas ainda tenham que ser mudadas pelo governo e aceitas pela sociedade. Assim como eu, sei que muitas pessoas ficaram indignadas com a atitude preconceituosa do Sr. José Lima, como vc pode ver nos comentários de outros blogueiros que se solidarizaram e postaram o seu relato como forma de protesto a tal atitude em seus blogs também. Obviamente estou postando o desenrolar dessa história que foi publicado no jornal A CAPA, e esperamos que este Sr. Lima, receba a punição devida. Bjo enorme em seu coração!
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